O fascínio que as bets, como são conhecidas as apostas on-line, despertam em crianças e jovens, principalmente pela proximidade como futebol, tem sido motivo de preocupação em diversos países. Governos como os de Reino Unido e França, entre outros, passaram a impor regras mais restritivas aos anúncios das apostas esportivas.
Especialistas comparam o fenômeno à publicidade do tabaco, que por muitos anos foi permitida e levou à do consumo do cigarro. No Brasil, a propaganda excessiva se soma à falta de regulamentação, que só agora começa a ser enfrentada. Isso permitiu que o público infantojuvenil tivesse acesso a uma atividade que é proibida para menores de 18 anos.
No Reino Unido, a Premier League, um dos mais populares campeonatos de futebol do mundo, anunciou a proibição da propaganda de bets na parte da frente das camisas dos jogadores – em times como Manchester City e Arsenal -, partir da temporada de 2025-2026. Anúncios nas mangas dos uniformes e nos estádios ainda serão permitidos.
O governo britânico também divulgou este ano novas regras para as empresas de apostas, que exigem maior controle de idade nas plataformas e a opção para que o consumidor possa escolher se quer ou não receber propagandas. As apostas esportivas cresceram nos últimos anos no mundo todo, especialmente após a Copa do Mundo de 2018, e se intensificaram durante a pandemia em muitos países.
No Brasil, a publicidade excessiva se soma à falta de regulamentação, que só agora começa a ser enfrentada. Isso permitiu também que o público infanto-juvenil ficasse desprotegido e tivesse acesso a uma atividade que é proibida para menores de 18 anos.
Na França, atletas populares entre as crianças – como Kylian Mbappé, francês que joga no Real Madrid – não podem mais ser estrelas de propagandas de bets desde 2023. As logomarcas das empresas também não devem estar em camisas esportivas que tenham tamanho infanto-juvenil.
Um dos relatórios mais contundentes sobre o assunto foi publicado por uma comissão do Parlamento da Austrália no ano passado. “O jogo online tem sido deliberadamente e estrategicamente comercializado juntamente com os esportes, o que o normalizou como atividade divertida, inofensiva e sociável”, diz o texto, acrescentando que a “publicidade dos jogos incita as crianças a jogarem e terem comportamentos de risco”. “A enxurrada de publicidade é inescapável”, finaliza.
O documento chamado “Você ganha um pouco, você perde muito” (em tradução livre) recomenda 31 medidas ao governo australiano para conter o avanço das bets, entre elas regular a publicidade. A exposição aos jogos, segundo o texto, “não tem precedentes, e nunca uma geração viveu isso antes”.
O relatório ainda compara a publicidade das apostas à que foi feita no passado pela indústria do tabaco e pede, assim como foi feito no cigarro, campanhas de conscientização para crianças, famílias e escolas.
Recomenda também claras indicações nessa publicidade sobre os problemas que as apostas podem acarretar às pessoas, o que inclui vício, perdas financeiras, problemas de saúde mental e até suicídio.
“Uma das coisas que aprendemos tão bem com o tabaco é que as mensagens contrárias são parte extremamente importante da prevenção aos danos que esses produtos podem causar às pessoas”, afirma no relatório australiano a professora de Saúde Pública da Deakin University Samantha Thomas, que foi ouvida pela comissão.
Nos Estados Unidos, alguns Estados, como Nova York, proibiram recentemente propagandas de apostas esportivas perto de universidades. Este mês, um senador e um deputado democratas apresentaram projeto de lei que impede a propaganda de apostas durante eventos esportivos ao vivo e ainda campanhas com atletas universitários.
As bets são permitidas em 38 Estados do país e lá estão ligadas especialmente ao futebol americano. Estima-se que 7 milhões de pessoas tenham problemas de saúde mental ou financeiros por causa do vício em jogos nos EUA. A nova lei também quer impedir que se use inteligência artificial para mapear hábitos dos apostadores e oferecer jogos de acordo com isso.
No Brasil, resolução do Conselho Nacional de Autoregulação Publicitária (Conar), de fevereiro, sobre apostas online, inclui a preocupação com o público infanto-juvenil. Deixa claro que os anúncios precisam ter a indicação de que a atividade é para maiores de 18 anos e não devem usar “símbolos, recursos gráficos e animações, linguagem, personalidades ou personagens reconhecidamente pertencentes ao universo infanto-juvenil”.
Afirma também que as propagandas só podem ser feitas por “influenciadores que tenham adultos como seu público-alvo”. “Há problemas de publicidade offline, por causa dos esportes, nos estádios, nas camisas de time, e online, nas plataformas da internet”, diz a coordenadora do eixo digital do Instituto Alana, Maria Mello.