Quando eu era criança, lembro de uma situação recorrente que me incomodava ao participar de qualquer festa: a hora em que os pais e parentes chamavam seus filhos para tirar fotos. Era chato. Eu não era a única criança que detestava fazer pose, fingir um sorriso ou fazer qualquer coisa que não fosse brincar e aproveitar o momento. Olhando hoje, compreendo que a intenção dos adultos era valiosa; registrar momentos é algo realmente admirável, pois só se vive uma vez, e o tempo é algo que nunca volta. Pensar sobre essas coisas é uma consequência direta da surpresa que eu tive ontem à noite, enquanto observava uma cena em um restaurante.
Era um rodízio de pizza. Em uma mesa, uma menina celebrava seu aniversário de 10 anos, acompanhada da família e dos seus coleguinhas da mesma idade. Lá pelas tantas, vi que essa mesma menina (que, embora eu não tenha certeza, julgo ser a aniversariante) estava postando alguns stories no seu Instagram. A ideia de uma criança usar uma rede social pautada no uso da imagem me deixou preocupado. "Registrar" momentos deveria ser uma preocupação de um adulto e não de uma criança — e ainda coloco a palavra entre aspas porque o real intuito das redes sociais não é registrar momentos, e sim compartilhá-los ou usar a própria atividade como instrumento de status. E é essa a parte problemática.
Uma criança que cria histórias (stories) do que está fazendo começa, desde cedo, a ver a si mesma como uma empresa. É o que a maioria de nós faz ao usar o Instagram como currículo de nossas vidas, tanto para nossos serviços profissionais quanto para nossa vida pessoal. Se, para nós, isso já é extremamente tóxico, pela comparação e pela constante percepção ilusória de que os outros têm vidas mais interessantes que a nossa — seja pelos corpos sarados, viagens à Europa, habilidades melhores que as nossas em instrumentos musicais, conhecimento, capacidade de comunicação, número de seguidores etc., que as pessoas que seguimos têm a mais do que nós — como poderia ser menos problemático para pessoas que nem chegaram à adolescência?
Pensando ainda mais sobre isso, surge-me outra preocupação: será que estamos esquecendo de registrar momentos em nossa ânsia de usá-los como vitrine de quem somos? Somos expostos, todos os dias, a uma explosão de imagens, ao mesmo tempo que nós mesmos tiramos fotos e fazemos vídeos constantemente, alguns diariamente. Mas… daqui a 30 anos ainda teremos acesso a esse acervo? O Instagram e o backup de imagens do Google talvez não existam para sempre. Os pendrives estão cada vez mais obsoletos, assim como os CDs, DVDs e disquetes, que um dia usávamos para salvar arquivos e hoje existem mais em nossa memória do que no mundo físico. O que fica para sempre mesmo são os álbuns de fotografia, mas… vocês lembram da última vez que fizeram um? Eu não lembro!
Precisamos equilibrar a vida que vivemos, a que vendemos e a que registramos. Sabemos disso há muito tempo, mas eu só queria deixar registrada a surpresa que eu tive ontem. Espero que a menina que tirou as fotos ontem as guarde com carinho em algum lugar… de preferência na memória!