No programa de entrevistas Provocações, da TV Cultura, o saudoso e lendário Antônio Abujamra, um dos maiores dramaturgos do Brasil, sempre perguntava a seus convidados “o que é a vida?” ao término de cada conversa.
Bem, se um dia alguém simplesmente me parasse na rua e fizesse essa pergunta, eu provavelmente ficaria sem palavras, atônito. Porém se eu fosse convidado ao programa, teria tempo de pensar numa resposta. E estou pensando nela enquanto escrevo esse texto.
A primeira resposta que vem à minha cabeça é uma perspectiva biológica, lembro das aulas de ciências da escola em que em algum momento se fala algo sobre o ciclo do ser humano: nascer, crescer, reproduzir e envelhecer. O ciclo não serve de resposta, não basta para definir o que é a vida, pois não queremos algo simplista. Se nenhuma vida em particular pode sequer ser resumida em uma cinebiografia de 3 horas sem trazer um sentimento de que faltou alguma coisa, então qualquer reducionismo é um insulto (e toda resposta será reducionista). Dizem, inclusive, que a vida é curta, mas quando tentamos defini-la vemos que nem é tão curta assim, a gente é que odeia a finitude.
Uma resposta de base biológica, por mais elaborada que seja, dificilmente satisfará os telespectadores do programa. Dizer que a vida é o intervalo entre o que acontece depois de nascermos e antes de morrermos não tem graça. Um livro de anatomia de medicina não contém informações suficientes para silenciar a pergunta, pois a gente quer emoção, sentimento e poesia. Aliás, o ofício dos poetas é justamente tentar colocar em palavras o que não pode ser colocado em palavras, dizer o indizível (que palavra feia!) e nem mesmo eles conseguiriam responder o que é a vida de forma satisfatória em seus versos, sejam eles curtos, longos, objetivos ou subjetivos.
Seja como for, aqui vão alguns ensaios do que eu poderia responder:
1. A vida, Abujamra, é o que eu sinto quando olho para as estrelas e esqueço que estou com frio. A vida é a lembrança que eu tenho do céu e do mar em minha infância, quando fui à praia pela primeira vez, em Arroio do Sal, e senti o gosto do sal na água enquanto meu pai me erguia em seus braços para me proteger das ondas.
2. A vida é um porre. Ela é um pêndulo entre o sofrimento e o tédio e se choramos mais de tristeza do que de alegria, isso confirma que a vida é uma punição que o acaso nos condenou.
3. A vida para mim são os momentos que compartilho com os meus amigos. Estar conversando com eles, acompanhado com mate ou cerveja, é o que deu e ainda dá sentido a tudo isso.
4. Não sei o que é a vida.
5. Quanto mais eu penso na vida, menos eu vivo. Então viver é parar de pensar o que é a vida.
6. Será que eu fechei todas as bocas do fogão antes de sair de casa?
Provocações ganhou uma releitura em 2019, o Provoca, com Marcelo Tas no lugar de Abujamra. Se um dia ele me convidar para o programa, acho que vou estar preparado para sua última pergunta!
* Leonardo Stoffels é Psicólogo e atende em Cerro Largo.